Hermético


Posso compor nesta escrita

um painel estranho e vasto

que bem pouco delimita,

tal o canto que contrasto.


Texto-coisa meio endógena em canção,

um caldo verde de coca e adrenalina,

uma poesia toda e pouco mínima

para suposta e eterna incompreensão.


E vultos letrados me saltarão

alegando total compreensão.


E decerto a frustração

sentirei ao perceber

que todos entenderão

o que tentei esconder.


Posso então consumar

o blefe de blefar.


Posso escrever palavras a esmo,

germinar triglicerídeos serpenteados

em coxas de texturas demoníacas.

Divisar pérgulas recalcitrantes

e recrudescer gotas de carvalho.

Preponderar algazarras e reticências.

E nos voluptuosos simétricos

descansar luto alucinatório.

Escandir filigranas de marcianas maçãs

e sorver temer driblar pedaços de luar.

Paro aqui, para vos poupar.


Posso tudo enrodilhar,

se ao poema interessar.

Mas não quero complicar,

destrambelhar o labor,

posto que liberto estou

das ambições de além-mar.


Quero só e no entanto

uma história contar.

Se for pra complicar,

silencio meu canto.


De complicado e de pouco valor,

basta meu vazio interior.